O tenente-coronel Mauro Cid trouxe à tona uma grave acusação ao afirmar, em sua delação à Polícia Federal, que o então presidente Jair Bolsonaro (PL) teria apresentado aos militares de alta patente uma minuta de decreto visando um golpe de Estado após o segundo turno das eleições de 2022. As revelações, divulgadas pelo UOL e pelo jornal O Globo e posteriormente confirmadas pela Folha de S.Paulo, têm causado um impacto significativo e gerado desgaste nas Forças Armadas, já que envolvem antigos líderes militares no centro das investigações.
As repercussões da acusação se manifestaram nas declarações do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, e também nas posições do Exército e da Marinha. Além disso, as discussões sobre a possível convocação de depoentes na CPI do 8 de Janeiro no Congresso se intensificaram.
A defesa de Bolsonaro emitiu uma nota afirmando que o presidente não endossou ações que não estivessem de acordo com a lei e que tomará medidas judiciais para combater eventuais acusações infundadas na delação premiada, sem mencionar diretamente o nome de Mauro Cid.
De acordo com o UOL, Cid teria relatado à PF que a minuta do decreto foi entregue a Bolsonaro por Filipe Martins, seu então assessor, e que o presidente a compartilhou com altos escalões militares. O tenente-coronel afirma que Almir Garnier, que na época era almirante e comandante da Marinha, teria se mostrado favorável à ideia do golpe durante conversas privadas, mas não houve adesão do Alto Comando das Forças Armadas.
No entanto, não foram fornecidas informações sobre a apresentação de provas que corroborassem as alegações de Cid à PF. A ausência de evidências materiais tem sido um desafio para a validação de denúncias, conforme estabelecido pela jurisprudência brasileira, que requer elementos de confirmação externos, como registros, mensagens ou documentos.
Seis generais do Alto Comando do Exército afirmaram que a consulta de Bolsonaro sobre o suposto apoio ao golpe não foi apresentada ao colegiado. No entanto, há a percepção de que o então comandante, general Freire Gomes, discutia tais assuntos com um grupo restrito de oficiais.
Filipe Martins, questionado sobre o assunto, não respondeu aos contatos, e seu advogado, João Manssur, afirmou não estar ciente do caso. Além disso, não houve resposta de um assessor de Almir Garnier quando procurado pela reportagem.
A defesa de Mauro Cid divulgou uma nota afirmando que os depoimentos são sigilosos e que, portanto, não confirmaria seu conteúdo. Vale destacar que, segundo a jurisprudência brasileira, a palavra oral por si só não é considerada prova suficiente para sustentar uma denúncia, sendo necessária a apresentação de elementos de corroboração externos.
As acusações de Cid têm levantado preocupações sobre a conduta das Forças Armadas após a derrota de Bolsonaro e sobre a influência de ideias antidemocráticas no meio militar. Uma pesquisa Datafolha recente mostrou que apenas 34% dos brasileiros consideram as Forças Armadas muito confiáveis, o menor índice desde 2017. Além disso, 61% acreditam que oficiais das Forças estiveram envolvidos em irregularidades durante o governo Bolsonaro.
Diante das repercussões da delação de Cid, o ministro Múcio expressou seu desconforto com a “aura de suspeição coletiva” que paira sobre as Forças Armadas. Ele reafirmou que um golpe contra a democracia não estava nos interesses das Forças Armadas e que eventuais atitudes isoladas não representam a postura oficial das instituições militares.
A Marinha, em nota, informou que não teve acesso à delação de Cid, enquanto o Exército afirmou que não comenta processos investigatórios em andamento, mas reiterou seu compromisso com a legalidade, ética e transparência. A CPI do 8 de Janeiro no Congresso também se debruçou sobre o conteúdo da delação, com parlamentares defendendo a convocação de Almir Garnier e Filipe Martins para depor.
Apesar dos esforços públicos, alguns parlamentares da base reconhecem que pode não haver disposição ou tempo para aprofundar as investigações, que devem culminar com a entrega do relatório em 17 de outubro, de acordo com o presidente da CPI, deputado federal Arthur Maia (União Brasil-BA). Eduardo Bolsonaro, membro da CPI, evitou comentar o assunto, alegando falta de informações sobre a delação.
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